São cerca de quatrocentas em Portugal e apoiam
mais de 150 mil pessoas, na sua grande maioria idosos e desvalidos. Falo das
misericórdias portuguesas, uma vasta faixa da população portuguesa é apoiada
por essas instituições multiseculares de inspiração cristã. São catorze as
obras de Misericórdia, sete corporais e sete espirituais, que estão na origem
da instituição das Misericórdias Portuguesas por influência da Rainha D. Leonor
de Lencastre. Durante muitos séculos da nossa história, estas foram as únicas
instituições que deram apoio aos mais carenciados.
Hoje, a grande maioria das misericórdias
portuguesas continua a ter uma importância muito relevante no apoio aos mais
carenciados e no combate à pobreza e consequentemente à exclusão social. Porque
o Estado não está onde devia estar para estar onde não deve, alguém tem que
fazer o seu papel.
Nos últimos tempos, na espuma da “silly
season”, depois de em 2016 alguns órgãos de comunicação social regionais terem
alertado para situações de eventuais maus tratos nas unidades de cuidados
continuados da Santa Casa da Misericórdia de Ponta Delgada, uma televisão
nacional trouxe ao conhecimento dos portugueses notícias sobre esses supostos
maus tratos.
Não vi nem vou ver a referida reportagem. Nem
sequer é o teor da mesma que me importa analisar mas sim a forma despicienda e
leviana como são feitos certos julgamentos públicos sem que se deixem as
instituições tratarem os assuntos como eles devem ser tratados.
“Houve queixas ao Ministério publico”,
comenta-se por aí nas redes sociais. Há-as todos os dias. E? Uma queixa no
Ministério Público implica culpa formada? Condenação? Sequer pressupõe um
facto? Claro que não!
Houve notícias nos jornais e televisões! Gritam
tresloucados e ávidos de sangue os mais atrevidos e assíduos comentadores dos
grupos do facebook e tweetam os mais presunçosos inocentes. E?
Esta é uma questão que nos devia preocupar a
todos, pois que ninguém está livre de uma cabala ou de lhe ser encontrado um
qualquer “rabo-de-palha” onde alguém possa chegar um fósforo.
Por estes mesmos dias, a direção de uma
Juventude Partidária, liderada por aprendizes de “gameleiros” ainda cheirando a
cueiros, vociferou acerca de questões da justiça e do direito. A solução para
todos os males, segundo essa gente, passa pela instituição da delação premiada
e pela inversão do ónus da prova. Medidas essas consideradas de relevante
importância para o combate ao crime.
Veja-se só o que fazem esses julgamentos
mediáticos. Levam a que esses imberbes “jovens turcos” direcionem, ora por mero
populismos ora por simples ignorância, o seu discurso no sentido de um certo
retrocesso civilizacional.
Para entendermos as morosidades do sistema judicial
e as suas bonomias, temos que nos centrar na história do direito que se
confunde, claramente, com a história do governo da Polis e da construção do
Estado-moderno.
O tempo da notícia, não é o tempo da justiça. O
direito não é jornalismo e as garantias que têm e devem ter os cidadãos sobre
as eventuais prepotências dos agentes do Estado não são coisa que tenha sido
fácil conquistar. O regresso a mecanismos como a delação premiada, e com maior
gravidade e alcance a inversão do ónus
da prova, potenciam um ror de atropelos às garantias dos cidadãos inaceitáveis
nos níveis de democracia que, mesmo deslastrada, a sociedade portuguesa já
atingiu.
O regresso aos julgamentos no largo do
pelourinho, que hoje pode aferir-se, são as redes sociais e as gordas nas capas
dos tabloides, é um retrocesso civilizacional enorme.
Aos jovens aprendizes de politiqueiros
recomenda-se que estudem filosofia antes de se inscreverem numa juventude
partidária.
São Lourenço, 03 de Agosto de 2018
Sem comentários:
Enviar um comentário