Quando nos debruçamos sobre as teorias filosóficas dos contratualistas, nomeadamente sobre Rousseau, conseguimos identificar inequivocamente como é que a sua teoria da “Vontade Geral” nos pode conduzir a uma enorme perda das liberdades individuais, ficamos escravos, cedemos direitos, apetites individuais, opções e escolhas morais e tudo isso em nome desse desiderato a alcançar, tudo isso em nome de uma coisa a que chamaram de “bem comum”, mas que não sabemos bem o que é. Essa chamada “Vontade Geral”, tantas vezes invocada pelos assaltantes de poderes por esta Europa fora, e pelas massas ululantes, é perigosamente usada como conjunto do “argumentário” para o coartar das liberdades individuais. Assistimos a isso, ainda recentemente, no combate à pandemia, nas crises do subprime e das dívidas soberanas e vamos assistindo a esses atropelos sempre que os Estados pretendem ir além daquilo que as suas próprias leis fundamentais preveem. A liberdade é, como tantas outras coisas, um bem ao qual só damos valor depois de a perdermos. Mas que, uma vez perdida, só é recuperável com muito esforço e não poucas vezes com sangue.
Obviamente, só os seres livres, de
pensamento livre e capazes de cogitar a construção de uma nação, seja ela a que
for, são habilitados a analisar e repensar a devolução de liberdades como um
meio para a construção de uma nação melhor. Os restantes, os que vivem
obcecados com a regulação, a legislação e com a ação do estado são incapazes de
admitir a falência desse sistema (desde logo por ignorância a seu respeito) e
agitam o fantasma do liberalismo e do neoliberalismo como se de coisa
perniciosa se tratasse. Na verdade, esse é o grande paradoxo do socialismo, seja
ele moderado seja ele radical. Por um lado diz-se democrático, defensor do
estado-social, garante e, às vezes, “dono” da liberdade, mas por outro culpa o
liberalismo e o neoliberalismo de todos os males da humanidade. Essa espécie de
jacobinismo serôdio, tem sido, de facto, o grande entrave ao desenvolvimento de
sociedades mais justas e mais equilibradas. O fosso entre ricos e pobres não se
cavou mais fundo por causa das liberdades, mas sim, ao invés, pela falta delas.
Foi a obsessão da regulação que destruiu a possibilidade de criar riqueza a
partir de muito pouco ou de quase nada. Foi a regulação que acabou com a
possibilidade dos chamados “self made man”. Foi o tal jacobinismo bacoco e
serôdio, que atrás referi, que condenou os novos empreendedores, criadores de
riqueza e consequentemente de postos de trabalho tantas e tantas vezes
apelidando-os de novos-ricos e patos-bravos e que os perseguiu com leis e
regulamentos que acabou lançando toda essa gente no desespero e a abandonar o
tecido empresarial. Foi a regulação, o “regulamentozinho”, a “regrazinha”, a
“fiscalizaçãozinha”, a “invejasinha”, o pequeno poder, a pequena “corrupção”
dai decorrente, que potenciaram a concentração de riqueza e não a defesa das
liberdades de estabelecimento, a proteção da propriedade privada e o comércio
livre. Enfim, o socialismo interventivo na economia condicionou, regulou,
regulamentou a vida dos cidadãos com tal complexidade que tornou o tecido
económico dependente do próprio sistema político, talvez fosse esse mesmo o
desiderato, tornar-nos todos dependentes de um qualquer Diretor Geral ou
Secretário de Estado como se de Senhores Feudais se tratassem. No entanto, não
se julgue este regime eterno.
Tal como escreveu Popper, Newton
enterrou o determinismo teológico do medievo substituindo-o por um determinismo
naturalista que Marx e Hegel substituíram por um determinismo histórico. Hoje o
determinismo teológico está reduzido ao extremismo islâmico e o determinismo
histórico às fábricas da nova china. As vozes em defesa de um Homem
verdadeiramente livre têm cada vez mais eco.
Mesmo nos países mais socialistas, onde
até na formatação das opiniões o estado tende a intervir, não há meio nem forma
de condicionar o pensamento e as opções éticas de cada um. É nas liberdades
individuais, nas opções e escolhas éticas que reside a essência da nação e não
no Estado. A nação é o conjunto alargado das opções livres dos cidadãos o
Estado é o conjunto das cedências que cada um de nós faz dessas liberdades.
Quanto mais pode o estado menos podem os cidadãos e quanto menos podem os
cidadãos menos livre é a nação. Nesses casos, vamos assistindo permanentemente
a atropelos às constituições, à alteração de regras, leis, normas, portarias e despachos,
ao jeito das necessidades do momento e dos casos. Práticas altamente perigosas
e perniciosas para a nação vinda do estado que, por isso, deixa de ser “pessoa
de bem”. Vivem-se dias em que é comumente aceite o “rasgar” do contrato social.
Melhores dias virão mas, para isso, todos temos a responsabilidade de proteger
o estado de direito democrático e liberal dos desmandos totalitaristas daqueles
que se dizem democratas mas disso têm pouco.
Haja Saúde
In Jornal Diário Insular. edição de 20 de setembro de 2022
1 comentário:
Caro Barata.
Por engano coloquei um comentário num outro lugar, mas no essencial quero dizer sobre este teu texto, que ele tem os presupostos errados ou insuficientes, mas que chega a um alerta mais importante que tudo o resto, pois a chamada a despertar consciências sobre o cerco que as liberdades passam, é fundamental apesar de o que se vive nada ter a ver com socialismo, nem o liberalismo econômico resolve as questões mais pertinentes da economia do país e do Povo, mesmo que a parte das liberdades liberais possam ser chamadas neste momento, como forma de clarificar alguns equívocos de verdadeira ditadura disfarçada de democracia...
Parabéns pela denúncia oportuna, corajosa e necessária.
Açor.
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