9 de setembro de 2018

Coluna Liberal - Jornal Diário dos Açores 07 de Setembro de 2018


Na década de 80 do século passado emergiu na humanidade uma nova era liberal. Com políticos como Margaret Thatcher e Ronald Reagan, a precipitação da queda anunciada do comunismo nos países da ex URSS e do Pacto de Varsóvia e com os resultados relativos aos índices de bem-estar das populações que puderam fruir das vantagens das políticas económicas mais liberais, essas ganharam, claramente adeptos mas, como tudo também adquiriram críticos e até ódios.
O termo liberal, foi inclusive, ganhando contornos e acessões indevidas e até perniciosas.
Na verdade, o liberalismo que vivemos hoje é muito diferente do configurado no vastíssimo legado de Kant, o mais liberal e universal filósofo que a humanidade já conheceu, apesar da seu isolamento na sua pequena Königsberg, de onde nunca saiu e cujas rotinas, diz-se, serviam para os homens da cidade acertarem os seus relógios.
Na alba de XVII, Miguel de Cervantes na sua obra-prima, usa o termo “liberal” para caracterizar os Homens de “espirito aberto”, cordial, sensato, resumido como pessoa de quem se pode facilmente gostar. Não há, portanto, em D. Quixote qualquer tipo de conotação politica ou filosófica com o termo, ele é tão só visto como um conjunto de características  de uma determinada pessoa quer no domínio das suas escolhas pessoais quer no domínio da sua ação cívica.
Ora essa não é a conceção liberal que, mais tarde, já em XVIII, os chamados filósofos liberais defendem e advogam. Na verdade, com John Locke, Voltaire, já para não citar Stuart Mill ou Adam Smith, o vocábulo adquire uma carga conceptual e do domínio da gestão da polis mais acentuada. O conceito liberal vem contrapor-se essencialmente ao Rei Absoluto e aos seus dogmas. Os liberais de  XVIII defendem as liberdades individuais, o livre comércio e a concorrência como forma de promover a liberdade financeira dos cidadãos.
Os “pensadores livres” que defendem o Estado mínimo e laico.  A coisa pública liberta do obscurantismo religioso, são uma marca do liberalismo de XIX.
Voltemos então ao Século XX e às figuras de Margaret Thatcher e Ronald Reagan. Os chamados neoliberais. A queda da URSS e a demonstração à saciedade, do falhanço soviético e dos seus “satélites”, permitiu que uma certa direita conservadora tomasse a dianteira nas reformas ideológicas que a humanidade tanto necessitava. Foi essa direita que assumiu as bandeiras da reforma das instituições, do próprio estado e da liberdade. Parecia um contrassenso, no entanto a esquerda acanhara-se e deixara-se ficar num registo expectante apenas.
Mesmo depois da chamada crise do “subprime”, uma das maiores crises mundiais depois da grande depressão, que abalou seriamente a instituição liberal e as politicas austeras,  a esquerda manteve-se acanhada e resignada às evidencias, Veja-se o caso Grego ainda recentemente  badalado e que terá pela frente mais 20 anos de pura austeridade apesar da saída limpa de um plano de resgate que deixou na pobreza mais de 20% da população.  As nações, como os indivíduos, regem-se por uma conta de deve e haver e a Grécia, com ou sem Syrisa, não é diferente dos outros estados da união Europeia ou do Mundo.
O liberalismo de XX, o neoliberalismo de Thatcher e Reagan,  está aí para durar porque não foram esses os sistemas causadores das crises mas sim um sistema esdruxulo, inventado na europa como uma espécie de 3ª via e que sendo absolutamente interventor na economia dos países e na vida dos cidadãos se arroga de liberal e democrático coisas que não é.
Hoje, recuperamos alguns dos bons modelos dos anos 80 do século XX mas importa ir muito além da economia e do mercantilismo à escala global. Importa ir, por exemplo,  à recuperação dos conceitos como o das  liberdades individuais que hoje não  são coartadas por ordens de prisão arbitrárias mas sim por regulamentos, leis e posturas que determinam quem pode sobreviver e quem deve ser afastado.  Mais do que nunca, os medos atávicos, a autocensura e o comedimento com a liberdade de expressão, são factos que corroboram necessidades de mudança de paradigma. 
O estado omnipresente deixa o cidadão sufocado.





2 comentários:

Miguel Soares de Albergaria disse...

Em Portugal estamos entre uma coligação que torna o Estado omnipresente, e o presidente do maior partido da oposição que propõe que quem discorde dele no partido (como se presume que ele próprio em relação aos seus antecessores) abandone esse último. Do atual centrão não poderemos esperar um aumento das nossas liberdades individuais. Quem pretende esse aumento deverá procurá-lo por outro meio.

Nuno Barata disse...

Completamente de acordo. No entanto esse caminho de busca de uma solução para o país não está a ter o resultado que alguns esperavam. O Povo eleitor é cada vez menor, talvez por descrença ou egoístico conforto. As claques partidárias, são isso mesmo, uma espécie de holligans com opções politicas mais próximas daquilo que se pode chamar a fé de um adepto de um clube de futebol do que de um autentico cidadão. Vai vencendo o politicamente correcto que nem sempre ou quase sempre nem é sequer o justo e o eticamente mais aceitável.

Atacam-se as liberdades individuais e os seus defensores agitando um fantasma a que entenderam chamar de neoliberalismo, como se não estivesse provado na pratica e nos compêndios de historia dos últimos 2 séculos que este tem mais vantagens para o cidadão do que qualquer outro regime. O rebanho vai seguindo ordeira e ordenadamente o caminho que o leva á falta de liberdade. Alguns reclamam mas a maioria está a gostar de ser enganada.

Arquivo do blogue