A SATA está
a “ferro e fogo” depois de uma opera- ção de Verão perfeitamente desastrosa.
Depois de muitos anos de erros e desmandas internas a SATA cometeu, este Verão,
o único erro que nenhuma empresa em mercado aberto pode cometer: o de
desconsiderar os seus clientes ao submetê-los às consequências de uma operação
mal preparada e mal dimensionada. A palavra passada de boca em boca, por todos
os que foram afectados pelos atrasos e cancelamentos recorrentes, é a pior
campanha de marketing que a empresa poderia ter. A SATA foi, em tempos, uma
empresa de referência, regional e nacional, de boa gestão, de profissionalismo
e de um enorme orgulho por todos quantos nela, ou com ela, trabalhavam. Em
2008, a empresa tinha uma posição consolidada nos mercados onde operava, uma
saúde financeira invejável e uma enorme reserva de capitais, acumulada por uma
gestão de sucesso, num mercado que já come- çava, no entanto, a dar os seus
primeiros sinais de mudança, com o fim do monopólio da TAP nas ligações a
Lisboa e ao Porto. A SATA tinha, nesses tempos, uma estratégia bem definida, um
rumo bem traçado, e um objectivo claro, definidos pelo accionista, e
implementado, de forma diligente e responsável, por um conselho de
administração competente e conhecedor, à data, do negócio da aviação.
O actual
estado de degradação, financeira, operacional, da qualidade de serviço, e da
paz social, foi “construído” ao longo de muitos anos e foi fruto da total
incapacidade de adaptação da companhia às mudan- ças impostas pela evolução nos
mercados da aviação. A degradação começou pela delapidação das reservas
financeiras, com gastos em eventos faraónicos, de retorno muito duvidoso, com
aumentos desmesurados dos encargos com despesas de pessoal, mais de 30% em
poucos anos, para evitar greves, patrocionadas por todos os sindicatos, em
vésperas de períodos eleitorais, e com admissões de pessoal desnecessário, para
“pagamento” de favores políticos. A aquisição e o leasing de aviões
desadequados às operações da transportadora provocou o aumento anormal dos
gastos de manutenção e operação, sem que do lado da receita se tivesse o
contraponto financeiro. Os Dash Q400, adquiridos novos com recurso a um
avultado empréstimo bancário, não são adequados para fazer a operação
inter-ilhas no arquipélago, por serem aviões de última geração, feitos de ligas
leves, especialmente afectadas pelos gases vulcânicos e pelo ambiente marítimo.
Os seus motores, de alto rendimento e com ciclos de aceleração e aumento de
temperatura acentuados à descolagem, estão sujeitos a desgastes muito elevados
em voos curtos, inferiores a uma hora e meia, como aqueles que a SATA Air
Açores efectua. O A330, recentemente fretado, é um avião, com custos de
operação e consumos de combustível muito elevados, só se rentabiliza em voos de
longo curso, de duração superior a 8 horas, com taxas de ocupação médias
elevadas, acima dos 70%, e em operações não sazonais. A decisão por este avião
serviu somente os interesses dos pilotos da frota dos A310, que adquiriram
forma-ção num avião mais moderno, operado pela TAP e pelas principais
transportadoras aéreas. A nomeação de administrações incapazes de desenharem e
implementarem um plano estratégico para a empresa, que a prepare para vencer os
desafios actuais nos mercados da aviação e a ausência de uma definição clara
das linhas e orientações gerais do que se pretende para a SATA, demonstra a
incapacidade do accionista, ao longo de todos estes anos, para cumprir o seu
papel. A operação de Verão deste ano, em que mais de 40% dos voos para a
América e Canadá foram contratados a empresas “charter”, e que escalou para o
único A330 mais pilotos e co-pilotos que aqueles que dedicou à frota dos três
A310, mostra o perfeito estado de desorientação dos administradores, dos
directores, bem como, o total alheamento do accionista.
A SATA vai
pagar, este ano, vários milhões pelo fretamento de aviões e respectivas
tripulações, mantendo em casa os seus funcionários, pilotos e pessoal de
cabina. É uma decisão que, quase duplicando os custos de operação, dificilmente
se poderá entender. A empresa tem estado, há muitos anos, à deriva; as opções e
decisões tomadas têm sido, na maior parte das vezes, de natureza conjuntural,
nunca tendo havido a necessária coragem política para fazer a necessária
reestruturação da SATA. Sendo certo que se terá que reestruturar profundamente a
empresa, também é claro, em meu entender, que esta deverá ter um papel de
regulador do mercado, devendo por isso, manter-se na esfera pública. Não é a
entrada de capital privado, por si só, que trará a boa gestão, mas é esse mesmo
capital privado que trará uma gestão desligada do “serviço público”, sendo que
este é o que melhor salvaguarda os interesses dos Açores. A omissão do
accionista e a sua demissão do controlo que lhe é devido, poderá ser evitada no
futuro, pela criação de uma Estrutura de Missão, nomeada e tutelada pela
Assembleia Legislativa Regional dos Açores, composta por uma equipa
profissional e competente, com elementos dos diversos quadrantes políticos, que
defina as linhas gerais estratégicas para a companhia, que nomeie o Conselho de
Administração e acompanhe e vigie de perto os seus actos de gestão e os
impactos dos mesmos na saúde financeira da empresa. Uma Estrutura de Missão
como esta, dará a estabilidade necessária à equipa de gestão para reestruturar
a empresa; as nomeações e indigitações dos membros da administração, bem como
dos restantes directores da empresa, deixarão de servir para “premiar”
carreiristas e oportunistas políticos.
A actual
debilidade financeira da empresa e a incapacidade de gerar o capital circulante
necessário para a sua vivência diária, obriga à venda de activos. A frota da
Air Açores terá que ser alienada para que se diminuam os enormes encargos
financeiros e para que se volte a ganhar a necessária credibilidade perante a
banca, para se reestruturar a dívida do grupo; os “novos” aviões para a
operação inter-ilhas deverão ser fretados, em contratos de longa duração. Os
encargos com pessoal terão que se adaptar à realidade dos mercados e, mesmo que
temporariamente, reflectir as dificuldades de tesouraria da empresa. Se se
aligeirarem as condições e subsídios paralelos aos salários ainda inscritos nos
Acordos de Empresa, negociados e acordados no passado, para realidades
completamente distintas, conseguir-se-ão diminuições significativas, da ordem
dos 5% do total dos encargos com pessoal, de cerca de EUR 3 milhões. Os
sindicatos e os seus representados, têm que entender e aceitar que só pode
distribuir riqueza quem a gera; e a SATA, que somente tem gerado ao longo dos
últimos 5 anos, pesados resultados negativos, não tem riqueza para distribuir.
Toda a estrutura de liderança do grupo terá que sofrer alterações profundas; o
Grupo é constituído por empresas muito distintas e, por isso mesmo, a moldura
da estrutura da direcção deverá também reflectir essa mesma diversidade. A um
Conselho de Administração reduzido deverá reportar uma estrutura de directores
gerais em cada uma das empresas ou centros de custo autónomos do Grupo: a SATA
Air Açores, a Azores Airlines, a SATA Gestão de Aeródromos e o Centro de
Formação de Santa Maria. Só assim se criarão as dinâmicas de gestão,
operacional e comercial, que promovam o sucesso nos mercados em que cada
empresa irá operar.
A SATA Air
Açores, a operar ao abrigo do contrato de “serviço público” para o transporte
inter-ilhas, deverá acomodar a estrutura de apoio às operações do grupo,
contratualizando internamente os serviços prestados. Os custos operacionais
deverão ser diminuídos em mais de EUR 8 milhões, com o re-dimensionamento das
operações no Grupo Central, substituindo a lógica de ponto-a-ponto, por outra,
bem mais económica, de encadeamento circular entre as ilhas Terceira, Graciosa,
São Jorge, Pico e Faial. Fretando aviões de manutenção mais barata e mais
adaptados à realidade açoriana, aliviando os custos com pessoal e re-dimensionando
as operações, melhoram-se as contas e poder-se-ão, inclusivamente, praticar
valores de ida-e-volta entre os EUR 60 e EUR 80, servindo melhor os açorianos e
quebrando a sazonalidade do turismo de estrangeiros, ao promover o turismo
interno nos meses de época-baixa.
A Azores
Airlines deverá devolver o A330 ou, na impossibilidade de poder fazê-lo, deverá
afectá-lo a uma operação de afretamento a outras companhias. Os voos deverão
ser garantidos pelos A310, até outros aviões, mais adaptados às rotas e à sazonalidade
da operação dos voos de médio e longo curso, estarem disponíveis no mercado e
em quantidade suficiente para uma substituição integral da frota.
Comercialmente, a empresa deverá continuar a apostar na diáspora nos Estados
Unidos da América e no Canadá e, em simultâneo, expandir a promoção do Destino
Açores aos americanos e canadianos amantes do turismo de aventura e natureza;
os Estados Unidos e o Canadá são os principais mercados emissores de turistas
para este tipo de destinos, mais de 40% de todo o volume mundial. Na operação
Açores-Continente, os A320 deverão ser posicionados principalmente nas rotas
não liberalizadas, Horta, Pico e Santa Maria, pois são estas as que conferem a
protecção contra as guerras comerciais com as Low Cost; em Ponta Delgada e na
Terceira, os A320 deverão ser agentes reguladores do mercado, não permitindo
aumentos desmesurados das tarifas e garantindo as frequências necessárias a uma
boa qualidade de serviço.
A actual
estrutura de custos da SATA, não permite encarar de forma positiva, a livre
concorrência com as Low Cost. Quando a empresa decidiu entrar numa guerra
dessas no Funchal, aquando da liberalização das ligações aéreas para o
arquipélago da Madeira, perdeu muitos milhões de euros e foi obrigada a
abandonar uma operação consolidada há muito anos. A SATA Gestão de Aeródromos
deverá expandir os seus serviços para outros mercados, com aeroportos
semelhantes àqueles que opera nos Açores, fornecendo serviços de engenharia ou
mesmo, contratualizando concessões de gestão e operações de handling.
A enorme
experiência dos quadros da empresa e os elevados níveis de qualidade praticados
nos aeroportos dos Açores, capacitam a empresa para vencer em novos mercados.
O Centro de
Formação de Santa Maria deverá expandir as suas sessões de treino e formação a
alunos externos, numa altura em que se sabe que o mercado mundial está em
franca expansão, pois vai necessitar de formar milhares de tripulações nos
próximos 30 anos; só para pilotos, os diversos analistas mundiais do sector apontam
para a necessidade de formar mais de 600 mil novos profissionais.
Por tudo o
exposto acima, acredito que a solução não passa pela entrada de capital
privado, ou pelo despedimento em massa de quadros; essa é a receita, de efeito
duvidoso, daqueles a quem faltam ideias e verdadeiras soluções. O Quadro de
Pessoal da SATA é muito especializado, levou muitos e muitos anos a formar, e
será, todo ele, necessário para implementar uma estratégia de sucesso e
executar a necessária reestruturação do grupo.
A SATA pode
voltar a ser uma empresa de referência de aviação nos Açores e em Portugal.
Para tal, é necessário que o actual accionista tome as necessárias medidas para
a reestruturar profundamente. Deverá fazê-lo quanto antes, pois o mercado e os
concorrentes não esperam e a situação da empresa degrada-se cada vez mais, a
cada dia que passa. Não é com reuniões “Tupperware”, que mais não vão trazer do
que aquilo que todos já sabem há muito e muito tempo, que serão encontradas as
soluções. É com acções sérias e concretas, promovidas e implementadas pelo
accionista, que a SATA poderá voltar a ser uma empresa de sucesso.
*Ex-Director Regional dos
Transportes Aéreos e Marítimo
Jornal Diário dos Açores Edição de 29 de Agosto de 2017
Jornal Diário Insular Edição de 1 de Setembro de 2017
1 comentário:
Desconheço o senhor em questão no entanto ao seu comentário ou artigo, estranho sobretudo a falta de comentários, ou resposta a rebater. Sem dúvida mencionou dados importantes e verdadeiros e que embora se queiram esconder, são bem conhecidos. A SATA Internacional agora Azores Airlines iniciou-se com as "pulitiquices" e esse facto nada tem a ver com resultados económicos . A aquisição de aviões, decididas a belo prazer e interesse tal como os submarinos ,helicópteros e quejandos trouxeram fama aos governantes pela sua seriedade , desde o 25 de Abril. A realidade é que o País está a saque ocupando os estrangeiros o lugar dos nacionais pela falha propositada do sistema "pulítico" por eles (estrangeiros) fomentada na tal revolução de cordel.A ocupação económica é evidente e não necessita de soldados ocupantes como os alemães fizeram erradamente na Segunda Guerra Mundial. A "Resistance" fez o que os árabes fazem agora em desespêro de causa. Em suma,gostei de ler !
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