Do Estado de
Direito Democrático e das suas virtudes
-O senhor quer
fatura com contribuinte?
Pergunta o
empregado de balcão da loja ao cliente.
-Não! Responde
o cliente. E prossegue: O Estado não tem que saber onde estive, o que ando a
fazer e muito menos deve saber onde e quanto gasto do meu dinheiro.
Não há, nos
dias que correm, melhor forma de afirmar e de garantir a liberdade individual do
que se proteger do Estado, omnipotente e omnipresente que se foi construindo ao
longo dos últimos 50 anos. Na verdade, os grandes males que a esquerda e a
direita – mais a primeira do que a segunda - “controleiras“ infligiram sobre as
sociedades modernas (o estado é de facto uma invenção moderna) foi a ideia de
que o Estado não existe para servir os cidadãos mas sim o inverso. É verdade
que não devemos centrar a nossa vida na polis perguntado o que pode a polis pode fazer por nós mas sim o que
podemos nós fazer pela polis, ficou
celebre e faz todo o sentido, a frase de Kennedy “não perguntes o que a Pátria
pode fazer por ti pergunta antes o que tu podes fazer pela Pátria”. No entanto,
não pode o cidadão andar permanentemente a ser perseguido pelos agentes do
estado como se de um pervertido criminoso se tratasse nem pode o cidadão ser
escravo das voracidades do Estado e dos seus agentes.
Ora o que
melhor podemos fazer pela Pátria/Nação/Estado é participar da sua gestão das
suas decisões, das suas contradições e das suas certezas. A participação
politica, seja ela a que nível for, é a nossa melhor forma de afirmar a nossa
liberdade e de garantir as melhores decisões, mesmo que essa participação
cívica não vá além do ato de votar
O Estado de
Direito Democrático é um produto do liberalismo. Para os liberais – onde nos
incluímos- só os Estado de direito é capaz de garantir as liberdades individuais,
a proteção de uns em relação aos outros ( o homo
homini lupus de que nos fala Hobbes) e a propriedade privada.
Para que tal
seja possível, as regras do estado devem ser claras, abrangentes e aplicáveis a
todos os cidadãos sem diferenciação sem descriminações positivas ou negativas,
simples e de compreensão facilitada.
Nas sociedades
contemporâneas que melhor conhecemos e onde nos relacionamos, nomeadamente nos
países da União Europeia, infelizmente, esses princípios do Estado de Direito
Democrático e Liberal têm sofrido uma enorme erosão que nos tem trazido a
conflitos e cisões sociais cada vez mais difíceis de combater e dirimir. No
entanto, há ainda muitos grupos políticos que insistem em repetir à saciedade
que as sociedades contemporâneas carecem de mais regulação e regulamentação, de
mais descriminações positivas, de mais cisões.
Em nome de
questões como a segurança interna, a luta contra o terrorismo, a defesa das
minorias ou a simples proteção do “bicho papão” que é o capitalismo os mais
básicos princípios e preceitos do Estado de Direito Democrático estão a sofrer,
desde há algum tempo, na França, na Alemanha e em outros países da União, um
desgaste enorme, descurando assim, a proteção da informação individual e a
proteção dos direitos e liberdades individuais.
A construção
de um edifício legislativo por reação a um problema ou a uma questão social,
diz-nos a história, não traz vantagens, bem pelo contrário. Quando o Estado
legisla por necessidade (status
necessitatis) essa legislação tende a ser fundamentada em juízos subjetivos
já que o próprio conceito de necessidade, neste caso, é todo ele subjetivo face
àquilo que se pretende seja alcançado.
Em 2016 o
Conselho da Europa, na decorrência da declaração do Estado de Emergência em
França em finais de 2015 (13 de novembro), alertou para os perigos que
mecanismos políticos e judiciais como são a declaração do Estado de Emergência ou
o Estado de Exceção, constituem para própria democracia por confundirem, não
raras vezes, o facto e a necessidade de o prevenir com o próprio direto ou seja
com a necessidade da norma para cumprir ou revogar as lacunas de outra norma.
Os totalitarismos aplaudem.
Nunca é de
mais lembrar nem sequer exagerado recordar que foi o Estado de Exceção, Estado
de Emergência ou Estado de Necessidade ( cada um escolha terminologia que melhor lhe soar) que
permitiu a construção dos mais vis totalitarismos que a Europa viveu em todo o
século XX, na Alemanha, em Itália, em Espanha e até, se quisermos, em Portugal.
Nuno Barata Almeida e Sousa
Jornal Diário dos Açores edição de 29 de Setembro de
2017
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