30 de setembro de 2017

Coluna Liberal


Do Estado de Direito Democrático e das suas virtudes
-O senhor quer fatura com contribuinte?
Pergunta o empregado de balcão da loja ao cliente.
-Não! Responde o cliente. E prossegue: O Estado não tem que saber onde estive, o que ando a fazer e muito menos deve saber onde e quanto gasto do meu dinheiro.
Não há, nos dias que correm, melhor forma de afirmar e de garantir a liberdade individual do que se proteger do Estado, omnipotente e omnipresente que se foi construindo ao longo dos últimos 50 anos. Na verdade, os grandes males que a esquerda e a direita – mais a primeira do que a segunda - “controleiras“ infligiram sobre as sociedades modernas (o estado é de facto uma invenção moderna) foi a ideia de que o Estado não existe para servir os cidadãos mas sim o inverso. É verdade que não devemos centrar a nossa vida na polis perguntado o que pode a polis pode fazer por nós mas sim o que podemos nós fazer pela polis, ficou celebre e faz todo o sentido, a frase de Kennedy “não perguntes o que a Pátria pode fazer por ti pergunta antes o que tu podes fazer pela Pátria”. No entanto, não pode o cidadão andar permanentemente a ser perseguido pelos agentes do estado como se de um pervertido criminoso se tratasse nem pode o cidadão ser escravo das voracidades do Estado e dos seus agentes.
Ora o que melhor podemos fazer pela Pátria/Nação/Estado é participar da sua gestão das suas decisões, das suas contradições e das suas certezas. A participação politica, seja ela a que nível for, é a nossa melhor forma de afirmar a nossa liberdade e de garantir as melhores decisões, mesmo que essa participação cívica não vá além do ato de votar
O Estado de Direito Democrático é um produto do liberalismo. Para os liberais – onde nos incluímos- só os Estado de direito é capaz de garantir as liberdades individuais, a proteção de uns em relação aos outros ( o homo homini lupus de que nos fala Hobbes) e a propriedade privada.
Para que tal seja possível, as regras do estado devem ser claras, abrangentes e aplicáveis a todos os cidadãos sem diferenciação sem descriminações positivas ou negativas, simples e de compreensão facilitada.
Nas sociedades contemporâneas que melhor conhecemos e onde nos relacionamos, nomeadamente nos países da União Europeia, infelizmente, esses princípios do Estado de Direito Democrático e Liberal têm sofrido uma enorme erosão que nos tem trazido a conflitos e cisões sociais cada vez mais difíceis de combater e dirimir. No entanto, há ainda muitos grupos políticos que insistem em repetir à saciedade que as sociedades contemporâneas carecem de mais regulação e regulamentação, de mais descriminações positivas, de mais cisões.
Em nome de questões como a segurança interna, a luta contra o terrorismo, a defesa das minorias ou a simples proteção do “bicho papão” que é o capitalismo os mais básicos princípios e preceitos do Estado de Direito Democrático estão a sofrer, desde há algum tempo, na França, na Alemanha e em outros países da União, um desgaste enorme, descurando assim, a proteção da informação individual e a proteção dos direitos e liberdades individuais.
A construção de um edifício legislativo por reação a um problema ou a uma questão social, diz-nos a história, não traz vantagens, bem pelo contrário. Quando o Estado legisla por necessidade (status necessitatis) essa legislação tende a ser fundamentada em juízos subjetivos já que o próprio conceito de necessidade, neste caso, é todo ele subjetivo face àquilo que se pretende seja alcançado.
Em 2016 o Conselho da Europa, na decorrência da declaração do Estado de Emergência em França em finais de 2015 (13 de novembro), alertou para os perigos que mecanismos políticos e judiciais como são a declaração do Estado de Emergência ou o Estado de Exceção, constituem para própria democracia por confundirem, não raras vezes, o facto e a necessidade de o prevenir com o próprio direto ou seja com a necessidade da norma para cumprir ou revogar as lacunas de outra norma. Os totalitarismos aplaudem.
Nunca é de mais lembrar nem sequer exagerado recordar que foi o Estado de Exceção, Estado de Emergência ou Estado de Necessidade ( cada um escolha  terminologia que melhor lhe soar) que permitiu a construção dos mais vis totalitarismos que a Europa viveu em todo o século XX, na Alemanha, em Itália, em Espanha e até, se quisermos, em Portugal.


Nuno Barata Almeida e Sousa

Jornal Diário dos Açores edição de 29 de Setembro de 2017

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