26 de novembro de 2019

Património?


Parece que é Doutor em Ciências Sociais, não tenho bem a certeza porque andei a buscar na rede e não encontrei senão algumas, poucas,  referencias soltas. Francisco Sarmento dirige o escritório da ONU para a Agricultura e Alimentação (FAO) em Portugal e na Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) desde 2016 e esteve na passada  semana na Ilha Terceira onde deve ter dito coisas lindíssimas mas, como de costume, pouco uteis para quem se levanta de manhã cedo e se deita de noite tarde na luta diária (365 dias no ano) para pagar as contas, cada vez mais difíceis de pagar. Num congresso de Agricultura repleto de fatos escuros e gravatas contrastantes, com pouca gente que vive de trabalhar a terra e  muitos que vivem de falar disso ou de  canibalizar o sistema com os seus produtos milagreiros ou com as suas estratégias comerciais encapotadas de cooperativismo e associativismo, essa criatura terá alvitrado a hipótese de candidatar a Agricultura Açoriana a Património da Humanidade. Essa gente não sabe mais o que dizer para cair nas graças de quem a mantém de barriga cheia. Deixem de convidar gente dessa, por favor, pela nossa saúde mental.


In Jornal Açoriano Oriental edição de 26 de Novembro de 2019

22 de novembro de 2019

Sou



Cantarolava uma musica do Zeca:

"Quero ver o que Terra me dá/Ao romper desta manhã/O poejo, o milho e o araçá/A videira e a maçã (...)" devia estar a fazê-lo com tanta afinação que alguém ali perto exclamou,: afinal também sabe cantar. 

-Sim gosto de cantar mas não o faço mais amiúde por vergonha, disse timidamente.

- Vergonha? Mas qual vergonha, até canta bem!

-É por isso mesmo, disse eu,  para não dizerem: Porra também cantas?

Mais adiante, num  ambiente completamente diferente onde eu ia cansado, esfomeado, quase zangado mas cantarolando  desta feita um poema do incontornável António Melo Sousa musicado pelo não menos incontornável Luís Bettencourt,

 "Esta rosa que te ofereço,
é um dom que não tem preço
é a flor que em mim plantaste.
São pétalas são espinhos
que enfeitam os caminhos
do coração que assaltaste.
Há um jardim em teus olhos
feito de ternura aos molhos
e encantos de promessas…
hei-de ser o jardineiro
que cultiva a tempo inteiro
esse canteiro de esperanças.
Virão chuvas, virão ventos,
virão temporais aos centos
pra murchar nosso desejo,
esperaremos pelo Sol
como quem busca o farol
que anuncia o novo porto,
navegaremos os medos
como quem desfaz enredos,
que a vida sem aventura
é pássaro sem ninho,
é uva eu não dá vinho,
é um mal que não tem cura.
Esta rosa que te ofereço
é um dom que não tem preço
é o amor que em mim plantaste.

Perguntou-me alguém em quem eu quase esbarrava: Quem és na verdade Nuno Barata, que ontem eras atleta de maratonas, hoje cantas o amor e amanhã serás agricultor depois da missa.
Entrei no café Royal, o Pedro serviu-me um café entre duas piadas de circunstância e veio-me à cabeça o Jorge Luis Borges:

"(...) somos aquilo que comemos, sem dúvida, mas também somos cada livro lido, cada história vivida nesse mar de letras e cada sensação experimentada ao longo de mil e um romances(...)"

Sou todos os livros  que li
Sou todos caminhos que percorri
Sou todos os amores que vivi
Sou um somatório
Sou matemática portanto.

19 de novembro de 2019

Açores Primeiro



No plano teórico repensar as politicas e planear o futuro são uma obrigação de todos os partidos, corporações e até dos cidadãos, tenham eles mais voz ou menos voz, mais palco ou menos palco. Nesse sentido faz toda a diferença quem promove o debate saindo da sua “zona de conforto”, de quem simplesmente não o faz por mero comodismo. Faz bem, por isso, o Partido Socialista em trazer à liça as questões que incomodam os açorianos por forma a traçar novos rumos. Foi assim que fez em 1995 António Guterres com os chamados Estados Gerais e assim fez Carlos César com a Nova Autonomia de 1996, dois movimentos que envolveram as elites nacionais e regionais (muitos independentes) com o intuito de quebrar os ciclos longos de governação do PSD esgotado de ideias e envolto em escândalos. Ora a diferença para este novo movimento está desde logo na falta das elites, mas até dou de barato que as escolhas feitas sejam as possíveis o que já é mais difícil de perceber é qual é o ciclo que o PS-Açores pretende quebrar? Senão o seu próprio ciclo longo de quase 24 anos de poder.



In Jornal Açoriano Oriental, edição de 19 de Novembro de 2019

14 de novembro de 2019

O bodo.

Estamos a entrar naquela altura do ano em que os privilegiados e até alguns mais remediados que aspiram alcandorar o “next floor” do elevador social, se agrupam, associam, organizam para como dizia alguém “jantarem lagosta para angariar fundos para oferecer massa aos pobres”. Fazem tudo isso acompanhado da mais elementar propaganda “marketista” e vão todos, muitos pelo menos, nessa cantiga. Esta é, de facto, uma época em que nos sensibilizamos um pouco mais com a pobreza, com a infelicidade e com a solidão do próximo mas isso não dá o direito de nos refastelarmos enquanto desejamos uns pacotes de arroz, massas e ou um mero “cabaz” com uns figos passados e uma garrafa de vinho do porto de 5ª categoria. A caridadezinha, como lhe chamava o “reviralho” que o estado social emergente dos anos setenta do século passado tanto criticou e tentou acabar, afinal não deixou de existir, apenas se passou a chamar “solidariedadezinha”. A diferença na prática é, no entanto, abismal, é que a caridade católica de então seguia os ensinamentos de Mateus (6:3) “(..), quando tu deres esmola, não saiba a tua mão esquerda o que faz a tua direita". 
Hoje tocam trombetas.

7 de novembro de 2019

Esvaziar.



Dentro do PSD cabe uma panóplia de militantes que vai desde os mais convictos social-democratas quase socialistas até ao mais radical dos reacionários da velha direita passando pelos desambientados liberais que encontraram em Passos Coelho um Porto de Abrigo. Com o advento de Rui Rio ficou claro: não há lugar aos liberais e muito menos aos radicais que, equivocados, permaneceram na esperança de um dia o PSD ser um partido de direita. São estes os militantes que apoiam André Ventura e o CHEGA, foram os primeiros a tomar a decisão de abandonar o partido e conseguiram eleger um Deputado nas últimas legislativas. O discurso mais amolecido mas contundente do líder do CHEGA, nos últimos dias, fez com que muita dessa gente envergonhada viesse para as redes sociais apoiar o então proscrito radical populista de direita e quase o transformam numa espécie de herói nacional que tem a coragem de dizer em voz bem clara e inequívoca o que muitos pensam apenas no mais íntimo dos seus silêncios. Apesar de me manter um liberar e achar que o caminho é o do liberalismo, prevejo um grupo parlamentar do CHEGA na próxima legislatura. 

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