Diário
dos Açores - Cavaco Silva fez bem em indigitar Passos Coelho como
Primeiro- Ministro?
Nuno
Barata- O presidente da República fez o que tinha que ser
feito tendo em conta que a PáF venceu as eleições de forma inequívoca, (isso
mesmo foi assumido por todos na noite de 4 de Outubro), vitória essa que se
torna tão mais inquestionável quanto era pouco espectável se tivermos em conta
que há menos de um ano o PS estava com 45% das intenções de voto expressas em
todas as sondagens. Constitucionalmente e consuetudinariamente o Chefe de
Estado não podia fazer outra coisa, politicamente assiste-lhe o direito de o
fazer. Além disso, apesar do tempo dado e dos indícios de existir um acordo, o
PS e os seus parceiros da chamada Maioria Negativa, não apresentaram ao
Presidente qualquer alternativa credível de estabilidade para o país. Cavaco
sabe, todos sabemos, que o assunto não é pacífico nem dentro do próprio PS,
basta para isso atentarmos às declarações, ainda recentes, de Vasco Cordeiro,
Francisco Assis e de tantos e tantos outros menos sonantes e, por isso, menos
ouvidos por esse país afora. Houve, inclusivamente, uma direita moderada,
protestativa, que terá votado no PS e esse eleitorado reclama ter sido enganado
pelas intenções do Partido Socialista governar com a extrema-esquerda
trotskista e marxista-leninista. Nunca é demais lembrar que essa direita já
assegurou 4 anos de estabilidade de um Governo do PS liderado por António
Guterres em 1995 e outro liderado por Carlos Cesar nos Açores em 1996 através
de acordos de incidência parlamentar que garantiram a aprovação de documentos
fundamentais. Muito eleitorado da direita moderada está mais próximo do PS do
que do PSD mas está nos antípodas do PCP e do BE.
Diário
dos Açores - Se este governo for rejeitado no parlamento pela
maioria de esquerda, o Presidente da República deve mantê-lo em gestão até
novas eleições ou deve indigitar António Costa?
Nuno
Barata- Não é claro que um Governo de Passos Coelho seja
rejeitado, António Costa não tem, neste momento, controlo sobre o Grupo
Parlamentar do PS e a imposição de uma disciplina de voto só viria piorar o
ambiente e poderia provocar um clima de sublevação entre os parlamentares
socialistas. Se a Democracia Representativa tem vantagens sobre outros sistemas,
uma delas é a capacidade de gerar movimentos dentro do quadro parlamentar que
podem garantir a estabilidade de governos minoritários. Se, no entanto, ao
invés, os grupos parlamentares de PS,BE e PCP, estiverem concertados e não
aprovarem o novo Governo, então não restará alternativa a Cavaco Silva e deverá
indigitar António Costa para formar um governo alternativo com apoio
parlamentar mesmo que estes não apresentem um documento orientador comum.
Poderá também optar por um governo de iniciativa presidencial mas é pouco
provável que isso aconteça atendendo a que está na fase final do seu último
mandato presidencial.
Manter o Governo de Passos Coelho em gestão, poderia
não ser uma má opção para o País e passaria para a responsabilidade do próximo
Presidente da República, cuja eleição será uma espécie de referendo à dicotomia
direita/esquerda, mas essa não é uma posição típica de Cavaco Silva. Poderá no
entanto, legitimamente tomá-la, afinal foi eleito por sufrágio direto e
universal por mais de 50% dos eleitores.
É sempre avisado ir à história recente. Jorge Sampaio
aceitou nomear um Governo liderado por um primeiro-ministro que não tinha ido a
votos e destituiu esse mesmo chefe de governo apesar da existência de uma
maioria parlamentar sólida e sem dar qualquer explicação ao país e ao
Parlamento, disse apenas que o fazia “pelas razões que todos conhecemos”. Nessa
altura Sampaio exerceu o seu poder de mais alto magistrado da Nação, fazendo
valer-se da sua condição de eleito directamente por sufrágio secreto e universal,
afirmando a condição de chefe de um regime semipresidencialista.
Diário
dos Açores - Seja qual for o cenário, vamos ter eleições a curto
prazo?
Nuno Barata- Essa é a grande incógnita
do momento. O PS já anunciou, no fim da reunião da Comissão Política Nacional
da passada quinta-feira, que irá apresentar uma moção de rejeição ao governo. Não
é expectável que algum dos deputados do PCP,PEV,BE e PAN vote contra essa
moção. No entanto, basta que 17 Deputados de entre os 86 do Partido Socialista
se sublevem para que o Governo passe no Parlamento. Porém, é importante ter
presente que mesmo passando o Governo é quase seguro que o Orçamento de Estado
para 2016 não seja aprovado tendo em conta a sede de poder do atual
Secretário-geral do PS que entretanto terá tempo para sanar os ânimos. Por
isso, na melhor das hipóteses, o Governo que sair da indigitação agora
conhecida, dura até ao Natal, se durar. Indigitado um novo primeiro-ministro
que será António Costa pôr-se-á, logo de seguida, a questão da aprovação de um
Orçamento de Estado compatível com os compromissos Internacionais assumidos,
nomeadamente as regras do Tratado Orçamental e as opções anunciadas e
prometidas aos Portugueses por essa maioria de esquerda que se diz mandatada
para as executar porque o Povo assim decidiu nas urnas. Como todos sabemos, até
pelo exemplo da Grécia, ainda bem fresco embora esquecido por outras notícias
providencialmente relevadas, neste xadrez da política orçamental da União e no
quadro do financiamento interno e externo, querer não é poder. É nessa altura
que veremos até onde vai a capacidade do PCP e do BE de se contorcerem para
aprovarem um orçamento que em pouco poderá divergir das linhas gerais do que
têm sido os orçamentos de Estado dos últimos 4 anos.
Não é de desprezar o facto de em Janeiro
ocorrerem eleições presidenciais e que essas podem configurar uma espécie de
escrutínio da tal maioria de esquerda. Na verdade, a escolha dos Portugueses
por uma opção de esquerda será amplamente questionada quando em Janeiro o Povo
escolher, como tudo indica, Marcelo Rebelo de Sousa para Presidente da
República por larga maioria. Nessa altura tudo muda para o PS, PCP e BE.
Por isso tudo, prevejo que, consolidada
a eleição de um novo Presidente da Republica, cumpridos os prazos
constitucionais e alterados os pressupostos da legitimidade democrática da Maioria
Negativa, possamos ter eleições antecipadas ainda antes do Verão do próximo
ano.
Diário dos Açores edição de 6 de Outubro de 2015
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