2 de novembro de 2015

Depois de 4 de Outubro - Mini entrevista

Diário dos Açores - Cavaco Silva fez bem em indigitar Passos Coelho como Primeiro- Ministro?

Nuno Barata- O presidente da República fez o que tinha que ser feito tendo em conta que a PáF venceu as eleições de forma inequívoca, (isso mesmo foi assumido por todos na noite de 4 de Outubro), vitória essa que se torna tão mais inquestionável quanto era pouco espectável se tivermos em conta que há menos de um ano o PS estava com 45% das intenções de voto expressas em todas as sondagens. Constitucionalmente e consuetudinariamente o Chefe de Estado não podia fazer outra coisa, politicamente assiste-lhe o direito de o fazer. Além disso, apesar do tempo dado e dos indícios de existir um acordo, o PS e os seus parceiros da chamada Maioria Negativa, não apresentaram ao Presidente qualquer alternativa credível de estabilidade para o país. Cavaco sabe, todos sabemos, que o assunto não é pacífico nem dentro do próprio PS, basta para isso atentarmos às declarações, ainda recentes, de Vasco Cordeiro, Francisco Assis e de tantos e tantos outros menos sonantes e, por isso, menos ouvidos por esse país afora. Houve, inclusivamente, uma direita moderada, protestativa, que terá votado no PS e esse eleitorado reclama ter sido enganado pelas intenções do Partido Socialista governar com a extrema-esquerda trotskista e marxista-leninista. Nunca é demais lembrar que essa direita já assegurou 4 anos de estabilidade de um Governo do PS liderado por António Guterres em 1995 e outro liderado por Carlos Cesar nos Açores em 1996 através de acordos de incidência parlamentar que garantiram a aprovação de documentos fundamentais. Muito eleitorado da direita moderada está mais próximo do PS do que do PSD mas está nos antípodas do PCP e do BE.

Diário dos Açores - Se este governo for rejeitado no parlamento pela maioria de esquerda, o Presidente da República deve mantê-lo em gestão até novas eleições ou deve indigitar António Costa?

Nuno Barata- Não é claro que um Governo de Passos Coelho seja rejeitado, António Costa não tem, neste momento, controlo sobre o Grupo Parlamentar do PS e a imposição de uma disciplina de voto só viria piorar o ambiente e poderia provocar um clima de sublevação entre os parlamentares socialistas. Se a Democracia Representativa tem vantagens sobre outros sistemas, uma delas é a capacidade de gerar movimentos dentro do quadro parlamentar que podem garantir a estabilidade de governos minoritários. Se, no entanto, ao invés, os grupos parlamentares de PS,BE e PCP, estiverem concertados e não aprovarem o novo Governo, então não restará alternativa a Cavaco Silva e deverá indigitar António Costa para formar um governo alternativo com apoio parlamentar mesmo que estes não apresentem um documento orientador comum. Poderá também optar por um governo de iniciativa presidencial mas é pouco provável que isso aconteça atendendo a que está na fase final do seu último mandato presidencial.
Manter o Governo de Passos Coelho em gestão, poderia não ser uma má opção para o País e passaria para a responsabilidade do próximo Presidente da República, cuja eleição será uma espécie de referendo à dicotomia direita/esquerda, mas essa não é uma posição típica de Cavaco Silva. Poderá no entanto, legitimamente tomá-la, afinal foi eleito por sufrágio direto e universal por mais de 50% dos eleitores.
É sempre avisado ir à história recente. Jorge Sampaio aceitou nomear um Governo liderado por um primeiro-ministro que não tinha ido a votos e destituiu esse mesmo chefe de governo apesar da existência de uma maioria parlamentar sólida e sem dar qualquer explicação ao país e ao Parlamento, disse apenas que o fazia “pelas razões que todos conhecemos”. Nessa altura Sampaio exerceu o seu poder de mais alto magistrado da Nação, fazendo valer-se da sua condição de eleito directamente por sufrágio secreto e universal, afirmando a condição de chefe de um regime semipresidencialista.




Diário dos Açores - Seja qual for o cenário, vamos ter eleições a curto prazo?

Nuno Barata- Essa é a grande incógnita do momento. O PS já anunciou, no fim da reunião da Comissão Política Nacional da passada quinta-feira, que irá apresentar uma moção de rejeição ao governo. Não é expectável que algum dos deputados do PCP,PEV,BE e PAN vote contra essa moção. No entanto, basta que 17 Deputados de entre os 86 do Partido Socialista se sublevem para que o Governo passe no Parlamento. Porém, é importante ter presente que mesmo passando o Governo é quase seguro que o Orçamento de Estado para 2016 não seja aprovado tendo em conta a sede de poder do atual Secretário-geral do PS que entretanto terá tempo para sanar os ânimos. Por isso, na melhor das hipóteses, o Governo que sair da indigitação agora conhecida, dura até ao Natal, se durar. Indigitado um novo primeiro-ministro que será António Costa pôr-se-á, logo de seguida, a questão da aprovação de um Orçamento de Estado compatível com os compromissos Internacionais assumidos, nomeadamente as regras do Tratado Orçamental e as opções anunciadas e prometidas aos Portugueses por essa maioria de esquerda que se diz mandatada para as executar porque o Povo assim decidiu nas urnas. Como todos sabemos, até pelo exemplo da Grécia, ainda bem fresco embora esquecido por outras notícias providencialmente relevadas, neste xadrez da política orçamental da União e no quadro do financiamento interno e externo, querer não é poder. É nessa altura que veremos até onde vai a capacidade do PCP e do BE de se contorcerem para aprovarem um orçamento que em pouco poderá divergir das linhas gerais do que têm sido os orçamentos de Estado dos últimos 4 anos.
Não é de desprezar o facto de em Janeiro ocorrerem eleições presidenciais e que essas podem configurar uma espécie de escrutínio da tal maioria de esquerda. Na verdade, a escolha dos Portugueses por uma opção de esquerda será amplamente questionada quando em Janeiro o Povo escolher, como tudo indica, Marcelo Rebelo de Sousa para Presidente da República por larga maioria. Nessa altura tudo muda para o PS, PCP e BE.
Por isso tudo, prevejo que, consolidada a eleição de um novo Presidente da Republica, cumpridos os prazos constitucionais e alterados os pressupostos da legitimidade democrática da Maioria Negativa, possamos ter eleições antecipadas ainda antes do Verão do próximo ano.


Diário dos Açores edição de 6 de Outubro de 2015



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