21 de junho de 2022

O ar une o que o mar separa

 

O título desta crónica semanal, em tempo de festejos dos Santos Populares, mais concretamente as Sanjoaninas desta Ilha de Jesus Cristo, vem a propósito da tomada de conhecimento do “plano de reestruturação da SATA”, sendo que reestruturação, no caso em apreço, é um mero eufemismo.

Partilho esta reflexão, nesta altura, também a propósito da ideia de transporte marítimo de passageiros interilhas, nomeadamente a denominada “Linha Amarela” (que, sazonalmente, no verão, ligou as ilhas das Flores a Santa Maria) e que alguns defendem, reclamando ter sido esquecida pela atual maioria parlamentar.

Comecemos, então, precisamente pelo transporte marítimo de passageiros e por uma declaração de interesses: Particularmente e em termos empresariais, a “Linha Amarela” dava-me imenso jeito. Fui um grande utilizador daquele serviço, de maio a outubro, e seria um enorme beneficiado do mesmo, se acaso ainda existisse. Essa realidade, acrescenta à minha pessoa uma relativa superioridade moral para defender o seu fim, pois, egoisticamente, deveria estar do lado dos que defendem a manutenção do sistema. Só que, na verdade, esse serviço sazonal revelou-se um descalabro financeiro e económico. Redundou na exportação de muitos milhões de euros em alugueres de navios e na aquisição de combustíveis, em pouco contribuiu para a coesão económica e social e teve um incremento enorme na pegada ambiental. Tudo isso para uma ocupação e uma utilização que não ultrapassou os 18%. Milhões a mais para transportar gente a menos!  Acresce o facto de que, em alguns anos, o prejuízo com aquela linha ter ascendido aos 12 milhões de euros, numa Região onde falta dinheiro para meios complementares de diagnóstico e terapêutica, onde os cidadãos ficam à espera mais de três meses por um exame médico, por falta de capacidade, quer no público, quer no privado, e onde as escolas caem aos bocados por falta de investimento e manutenção. São as prioridades que alguns, sempre os mesmos bem acomodados do regime, acham que têm direito. Provavelmente os mesmos que fazem os exames no privado, que recorrem à cunha para marcar exames médicos ou os que defendem o ensino privado para apenas lá meterem os seus filhos e netos… São os parasitas do regime, que criaram um sistema social e económico incapaz de tirar da pobreza os que já lá se encontravam e que tem lançado nela muitos que se remediavam.

Todo esse desperdício de recursos e esse esforço financeiro foi feito durante anos e, ao mesmo tempo, em que o transporte aéreo era desprezado. Esbanjaram-se milhões em barcos gregos deixando a nossa companhia aérea – a que verdadeiramente nos une – à beira de ter que fechar por via de experimentalismos em rotas internacionais perdulárias e aviões que, comprovadamente, não serviam as rotas consolidadas da empresa.

O preço a pagar por esses desmandos do acionista/governo será caríssimo e está a ser empurrado para diante também pelo atual governo de coligação PSD/CDS/PPM, lá para finais de 2025, ou seja, para depois das próximas eleições regionais (realizem-se elas no prazo previsto ou antecipadamente).

A SATA é um símbolo da perseverança e empreendedorismo de alguns açorianos micaelenses, principalmente do Dr. Augusto Rebelo Arruda. Surgiu como forma de combater a periferia da ilha de São Miguel face às ligações aéreas internacionais. A SATA Air Açores é a via para o nosso desenvolvimento, é o único instrumento de coesão entre os diferentes territórios insulares, e esse instrumento tem que ser verdadeiramente salvo, mas de forma racional. Para isso é preciso reestruturar, de facto, a companhia e estancar a sangria de recursos que tem sido a Azores Airlines (SATA Internacional). Contudo, não podemos continuar nem com experimentalismos nem a acumular dívida em cima de dívida, como tem acontecido nos últimos anos.

Boas Sanjoaninas!

In Jornal Diário Insular, edição de 21 de junho de 2022



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