Em Lisboa há 30 anos, morreu Nemésio. Vitorino Nemésio Mendes Pinheiro da Silva foi já, “Justamente considerado um dos maiores poetas e prosadores portugueses do século XX”.
A lua quase cheia numa noite clara de Inverno ilumina este canal que foi um dia de João Garcia e Margarida Clark.
Perco-me no mundo da poesia de Nemésio.
Semântica Electrónica
Ordeno ao ordenador que me ordene o ordenado
Ordeno ao ordenador que me ordenhe o ordenhado
Ordinalmente
Ordenadamente
Ordeiramente.
Mas o desordeiro
Quebrou o ordenador
E eu já não dou ordens
coordenadas
Seja a quem for.
Então resolvo tomar ordens
Menores, maiores,
E sou ordenado,
Enfim --- o ordenado
Que tentei ordenhar ao ordenador quebrado.
--- Mas --- diz-me a ordenança ---
Você não pode ordenhar uma máquina:
Uma máquina é que pode ordenhar uma vaca.
De mais a mais, você agora é padre,
E fica mal a um padre ordenhar, mesmo uma ovelha
Velhaca, mesmo uma ovelha velha,
Quanto mais uma vaca!
Pois uma máquina é vicária (você é vigário?):
Vaca (em vacância) à vaca.
São ordens...
Eu então, ordinalmente ordeiro, ordenado, ordenhado,
Às ordens da ordenança em ordem unida e dispersa
(Para acabar a conversa
Como aprendi na Infantaria),
Ordenhado chorei meu triste fado.
Mas tristeza ordenhada é nata de alegria:
E chorei leite condensado,
Leite em pó, leite céptico asséptico,
Oh, milagre ordinal de um mundo cibernético!
Vitorino Nemésio
A outra Margarida, que não a de mau tempo no Canal, a D.Margarida Vitória Marqueza de Jacome Correia, Nemésio deixou escritos vários poemas de amor e eróticos “Caderno de Caligraphia e outros Poemas a Marga». Compilados e editados por Luis Fagundes Duarte.
Em 28 de Junho de 2003 Pedro Mexia, sobre esse trabalho de Fagundes Duarte, escrevia assim no DNa:"Seria difícil um acontecimento literário mais importante do que este: um livro inédito de Vitorino Nemésio. Na verdade, não é uma surpresa para os nemesianos, que há muito sabiam da existência destes poemas. Nemésio preparou-os para a publicação, a cargo de Natália Correia, e mais tarde confiada, pela destinatária dos poemas, a Luiz Fagundes Duarte."
Não cantarei a virgem que o cavalo
Com um xairel de sangue arrebatou,
Quebrada pelo bruto, -nem levá-Io
Ao potro vingador de um verso vou.
Não cantarei tal noite aziaga. Falo
Apenas do que tenho, do que sou
Com ela, como o vinho no gargalo
Do frasco em que me bebe e me esgotou.
Nem cantarei a vítima do resto,
Violada na inocência que perdeu
Nas emboscadas de um punício lodo:
Que só meu próprio amor acendo. E atesto
A chama da Victória que me deu
Na margarida branca o mundo todo.
Pequena cronologia nemesiana aqui
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