“O Homem é propenso à dominação; atacamos os direitos dos
Reis absolutos e, em geral, todos desejamos ter o poder brutal do Czar da
Rússia” acabo de transcrever um parágrafo da obra Casaca Azul, que visitei já vão longe os anos 80 do século XX numa
caserna mofenta do também saudoso e
desaparecido Esquadrão de Lanceiros de Ponta Delgada enquanto cumpria o Serviço
Militar obrigatório. A obra autobiográfica de Henrique Escrich - novelista
Valenciano que viveu e morreu e se eternizou em Madrid na segunda metade do século
XIX – é constituída por um conjunto de novelas que se aproximam de ensaios de
filosofia social e politica. Perez Escrich vaticinava assim a revolução
bolchevique que viria a ocorrer 25 anos após a sua morte bem como previa o resultado
da mesma, mais absolutismo exercido por gente diferente que apenas ambicionava
os poderes de Nicolau Terceiro na senda de Pedro o Grande.
Na verdade, todos os processos revolucionários do século XX
redundaram na instalação de novos regimes autoritários e sanguinários, mudaram os
déspotas mas os métodos não. A Revolução Russa redundou num processo
sanguinário e numa das mais duras autocracias de toda a história da Humanidade.
A pretexto do assassinato de Serguei Kirov, Estaline desencadeou a partir de
1934 uma purga, a Grande Purga, que eliminou cerca de dois terços dos quadros
do próprio Partido Comunista Soviético e cerca de cinco mil oficiais do exército
vermelho considerados opositores do regime, ao todo José Estaline liquidou mais
russos do que Hitler executou judeus e isso tudo foi só há menos de um século.
As revoluções hispano-americanas produziram ditadores, à
esquerda e à direita, que fizeram de povos livres e ricos, legiões de escravos
famintos enquanto os seus lideres e herdeiros, ainda hoje, se passeiam pelos
corredores perfumados e alcatifados das instâncias internacionais ofendendo os verdadeiros
bastiões das liberdades como se, esses sim, fossem as forças perniciosas.
Em África as coisas não se passaram de maneira diferente,
basta olharmos o nosso processo de descolonização e os seus produtos mais
diretos como Agostinho Neto e José Eduardo dos Santos isso para nos determos
apenas na maior e mais poderosa das nossas ex-colónias.
Hoje, por cá, neste
amontoado de “umbiguismos” reféns de falta de horizontes, vivemos, ou
sobrevivemos entretidos a empobrecermos, navegando num outro tipo de absolutismo. O garrote sobre o verbo, sobre a liberdade de
expressão e sobre as mais básicas liberdades individuais deixou de ser feito
com recurso a prisões e leis especificas da censura e passou a ser exercido com
jeito e malicia pelas forças ocultas do estado omnipotente e omnipresente, do
“regulamentozinho”, da “portariazinha” muitas vezes feita com interesses
enviesados e outras tantas com justificações
ad hominem que provocam a pior
das reações, a autocensura que é bem pior do que a propriamente dita ação do
lápis azul. A nova tortura é a exclusão
e a fome e aos novos revolucionários não os espera um heroico regresso num
qualquer comboio da liberdade mas só e apenas a emigração como espécie de
exilio por convite sem direito a bilhete de regresso.
In Jornal Diário dos Açores, edição de 12 de Maio de 2019.
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