REQUIEM
Onde
era a Vila com suas ruas e casas
agora
é o asfalto do aeroporto.
Onde
o Convento ainda a igreja
e
talvez sernalhas e ratos
onde
era a frescura do claustro.
Já
não se vê onde morou James Mackay
e
a Rua das Flores foi cortada ao meio.
O
Avelar pegou de cabeça e outros
antes
quiseram morrer que ver a morte,
cater-pillars
e bull-dozers matando a Vila.
Mas
onde tudo isso era e eles lá
e
os plátanos da Praça e as araucárias
há
cem anos guardando a paz das casas,
agora
pousam aviões e há franceses.
Longe,
numa cidade a que chamam Lisboa,
a
Vila rendeu não sei quantos mil milhões
e
mil nepotes sentam-se à mesa,
empunham
facas e garfos, comem-na,
bebem-na,
enfeitam-se, corneiam-se,
vão
pensando se outras vilas – «lá na Ilha» –
ainda
mais haverá para vender
a
japoneses ou russos ou turcos
ou
a um qualquer emir atomizado
da
Arábia ou de Marte ou de Casa-do-Diabo.
Onde
era a Vila não tem importância,
nem
James Mackay, nem o Convento – nada!
Também
eu se calhar serei vendido
e
o preço (de saldo, claro está)
pode
dar para dois rissóis com salada
e
duas balas de peça
–
que os políticos comem
e
as fragatas decoram
Nossa
Desgraça Lisboa.
1972.
«Corografias», 1985
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