Quando o Estado passa de mínimo a máximo falha
e quando isso acontece ele, Estado, falha no mínimo e no máximo. Por isso, é corriqueiro
ouvir-se a frase, lugar-comum, de que quanto mais Estado pior Estado. Na
verdade, para as nações como para os indivíduos, quanto mais é diversificada a
sua área de atuação menor é o seu grau de especialização e menos é a sua
capacidade de intervir com rigor numa determinada área. Se nos casos dos
indivíduos essas práticas lhe dão ferramentas de adaptação a diferentes
circunstâncias já para as Nações/Estado as coisas são bem diferentes.
Voltemos à doutrina da construção do estado e
aos contratualistas. O Homem é, por natureza, imperfeito, cruel, mau e não
raras vezes cobarde. Dai a necessidade desta entidade a que hoje chamamos
estado e do contrato social, ou seja da relação contratual entre o individuo,
livre, em estado natureza e o estado.
Hobbes quando nos fala da necessidade de
ceder-mos alguns dos nossos apetites, interesses individuais, ao estado
explica:
“A única forma de constituir um poder
comum, capaz de defender a comunidade das invasões dos estrangeiros e das
injúrias dos próprios comuneiros, garantindo-lhes assim uma segurança
suficiente para que, mediante seu próprio trabalho e graças aos frutos da
terra, possam alimentar-se e viver satisfeitos, é conferir toda a força e poder
a um homem, ou a uma assembleia de homens, que possa reduzir as suas diversas
vontades, por pluralidade de votos, a uma só vontade”.
No entanto,
essa vontade única tem limites essencialmente assentes na proteção dos homens
dos apetites de outros homens. Nunca podemos deixar de vista que Hobbes entende o Homem como Lobo do Homem. Por
isso,"a obrigação dos súditos para
com o soberano dura enquanto e apenas enquanto dura também o poder mediante o
qual ele é capaz de protegê-los”
Esse
ser gigante a que Hobbes deu o nome de Leviatã, que engloba todos os poderes e
a quem cedemos algumas das nossas liberdades individuais é aquilo a que se
chama hoje o Estado, uma entidade abstrata construída por Homens para Homens e
para sua proteção.
Chegou então a altura de, de forma séria e
tendo por base a filosofia politica e essencialmente a construção do Estado
Moderno, refletirmos sobre as tragédias
que ocorreram no pais nos últimos meses e onde falhamos.
Desde logo falhamos porque cedemos ao Estado
algumas das nossas liberdades individuais para que o estado nos proteja mas
logo passamos a exigir do estado coisas para as quais ele não está vocacionado.
Fizemo-lo por demissão dos mais básicos deveres de cidadania, fizemo-lo por
comodismo e por egoísmo. Mas, sobretudo, fizemo-lo porque escolhemos para
constituir o Estado não os melhores dos Homens, nem os mais capazes mas sim
aqueles que nos dizem aquilo que queremos ouvir através da sua eloquência
oratória e da sua persuasão.
O Estado Contemporâneo, versão mais atual do
Estado Moderno, no caso Português, deixou de investir os seus recursos na proteção
dos cidadãos e dos seus bens e propriedades, para ocupar espaços onde não deveria
estar. O estado é banqueiro, comerciante, industrial e até pai de família mas
deixou ao abandono o comum dos cidadãos.
Abandonou milhares de pequenos povoados no
interior do país de onde retirou as esquadras da Guarda deixando as populações
envelhecidas à mercê de hordas de criminosos romenos e a quem lhe aponta o dedo
chama de xenófobo.
Fechou centenas de escolas obrigando as famílias
a deslocalizarem-se para centros urbanos maiores promovendo, assim, o abandono
do meio rural.
Encerrou centros de saúde de proximidade
patrocinando a deslocalização de doentes e respetivas famílias para centros
urbanos maiores e deixando ao abandono milhares de pequenas aldeias e
povoações.
Desinvestiu e desmantelou a Corpo da Guarda Florestal
que era um dos pilares da prevenção dos fogos florestais, acabou com os
cantoneiros, com os guarda-rios e com mais uma série de agentes do estado que estavam junto das populações, faziam parte
das comunidades e faziam parte do meio rural confundindo-se muitas vezes a
profissão com as suas próprias vidas no bom sentido que isso pode ter.
Tudo isso foi feito nas barbas do cidadão
pagante, do cidadão contribuinte que viu assim diminuída a sua segurança, a proteção
devida à sua propriedade apesar de , cada vez mais, ser vitima da entrada do Estado
na sua esfera privada.
Tudo isso foi feito em nome da economia de
meios da sobrevivência das instituições e toda essa poupança foi investida
(dizem eles) a salvar bancos e o sistema
bancário. Para isso houve sempre recursos, só não há recursos quando se trata
do estado cumprir a sua verdadeira função, proteger os cidadãos e a sua
propriedade.
Um estado que não o faz, é um Estado à beira
do falhanço, e não digo que é um Estado falhado porque este é um conceito mais restrito
e tecnicamente muito bem definido.