10 de dezembro de 2018

Insónia

Ele estava ali, ainda mal acordado e mal recuperado de uma noite mal dormida, mal sentida, mal vivida, mal resolvida. Tudo na sua vida está mal resolvido. Só Deus. Só o seu Deus sabe. Ele permanece ali, no alto, olhos postos em nada, talvez no lago escuro. No alto. Naquele alto da serra de Água-de-Pau onde já fora tantas vezes feliz. Ali impacientemente, como sempre, espera o Sol. Perto de Deus, perto do seu Deus. Era uma madrugada de Outono em dia de Nossa Senhora Imaculada, Mãe do seu Deus vivo. Ele estava ali esperando o sol aparecer e mostrar a Ilha, a sua Ilha. E o sol mostrou-se tímido a subir o horizonte-deixando recortado entre o azul cobalto do Céu e línguas de fogo - o Pico da Vara. A montanha que o viu nascer e crescer. A montanha, o Planalto a Serra fazem parte dele, do que resta dele. Ao longe o sol deixa aparecer a outra ilha, a Ilha que o adotou, a Ilha que ama como se dela tivesse nascido. A primeira e a décima são as suas ilhas do coração. Caminha entre trilhos de cabreiros e que agora são também de turistas, as gaivotas levantam-se. Na voz de uma “Ganhôa” deixa levar-se. O Pico Alto está mesmo ali ao lado, a 50 milhas náuticas de viagem, mas mesmo ali ao lado. Caminha sem direcção, vai e volta ao mesmo lugar onde fora feliz um dia, tantos dias. Entra no carro e segue o caminho de regresso para lado de nenhum. Na rádio passa
“Quem me dera
Abraçar-te no outono, verão e primavera
Quiçá viver além uma quimera
Herdar a sorte e ganhar teu coração”

1 comentário:

Anónimo disse...

Profundo.

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