Quem
cresceu durante a Guerra Fria, quem assistiu ao advento da televisão nos Açores
e quem gosta de política seja ela doméstica ou internacional, não deixou passar
despercebido o nome do grande estratego e diplomata norte americano que neste
sábado dia 27 de maio completa 100 anos de idade. 100 anos de vidas, como
escreveu há dias Paulo Portas. O plural é delicioso e “principescamente” utilizado pois na verdade
Kissinger viveu muitas vidas nestes seus 100 anos e dele dependeram outras
tantas vidas políticas e milhões de vidas humanas.
De
Tucídides e da Guerra do Peloponeso aos nossos dias, passando por Maquiavel,
Hobbes, Morgenthau, Clausewitz, Spykman e até Aron, todos teorizaram sobre a
necessidade dos estados se defenderem dos outros estados numa permanente
competição pelo poder. Henry Kissinger, o expoente máximo desse realismo
político e cético, foi nos nossos dias aquele que melhor soube interpretar a
necessidade dos povos e dos estados se defenderem uns dos outros num jogo permanente
de “enredos” diplomáticos e bélicos. Na verdade, os valores morais do ambiente
interno, mais deontológico, não condicionam as tomadas de posição no ambiente
externo onde a moral é apenas teleológica e onde esse telos é apenas o
interesse dos estados e das nações.
Nas
relações internacionais, e sem que as nações se tenham conseguido organizar
apesar das tentativas da Sociedade das Nações e da Organização das Nações
Unidas e outras tantas organizações internacionais que servem bem o intento de
criar lugares para políticos em tempo de reforma, prevalece uma desordem
mundial, ou seja um ambiente de plena anarquia, e nesse campo não há lugar a ideologias nem a
utopias, é a chamada “realpolitik” que conta e, por isso, os estados têm que se
proteger e agir de forma a garantirem a sua segurança, identidade e cultura ou
então serão ultrapassados por queles que o façam de forma veemente, clara e com
recurso à força se for caso disso.
Aos cem anos de idade, a realpolitik do
pós-guerra e de Kissinger, volta a estar na ordem do dia. De Tucídides aos nossos
dias, da Guerra do Peloponeso à tomada de Bakhmut.