25 de outubro de 2022

Dos rumores

 

Decorria o Ano da Graça de 2009 quando pela chancela da Princeton University Press deu aparição aos escaparates das melhores e mais prestigiadas livrarias do mundo o ensaio de Cass Sunstein “ On Rumors: How Falsehoods Spread, Why We Believe Them, What Can Be Done.” Nessa obra extraordinária de apenas cem páginas do prestigiado advogado, especialista em direito constitucional e filósofo das leis que foi ainda, durante a Administração Obama, Administrator of the Office of Information and Regulatory Affairs, o leitor pode percorrer do ponto de vista do direito e da ética, como se espalham os boatos, o porquê de muitos agentes políticos usarem esse mecanismo e ainda da propensão que alguns grupos têm para acreditarem e multiplicarem esses rumores ou boatos de forma a deles tirarem benefícios políticos e eleitorais quer para garantir a conquista de pequenos ou grandes poderes, quer na tentativa de os perpetuar. Ao processar uma qualquer informação, as pessoas e os grupos de pessoas, tendem a acreditar no que querem e deixam-se influenciar não só pelas suas emoções como também pelos seus preconceitos. No mundo globalizado das redes sociais que já não estão sequer à distância de um click no desktop como estavam quando Sunstein escreveu o referido ensaio, mas sim à distância de um deslizar de dedo quase em qualquer lugar do mundo contemporâneo, esse fenómeno é ainda mais fácil de proliferar e de promover. No entanto, a técnica de lançar um boato continua a ser promovida pelos mais conservadores de forma encapotada e sem deixar rasto. Normalmente passa por dizer: Não contes a ninguém e ninguém pode saber que fui eu que te disse isto, mas… . Daí até à mentira, o boato, o rumor rolar pelas redes sociais e pelos grupos de WhatsApp, numa empresa, numa instituição e no resto do mundo vai um ápice de cabo de fibra ótica. Na política açoriana nos últimos dias, semanas e meses, a técnica dos incapazes tem sido essa. Lançar rumores e suspeições, mesmo através dos órgãos de comunicação social tradicionais, sobre factos e acontecimentos para alterar, ou o sentido das coisas, ou para que tudo fique na mesma mudando qualquer coisinha. Essa é a arma dos incapazes e dos que, mesmo com ideias não as sabem executar ou falta-lhes coragem para o fazer. Para reformar é preciso assumir ruturas, quebras de preconceitos e desenvolver novas políticas e ter coragem para se assumir os resultados dessas mesmas reformas e mudanças. Não basta, agitar uma bandeirinha, esse é o trabalho dos conspiradores, dos pequeninos, dos reacionários. É necessário reformar modelos e revolucionar soluções. Os que chegaram agora ao poder não têm nem a capacidade para reformar, nem a coragem de assumirem os resultados dessas revoluções. Foi então que redescobriram uma nova técnica, deixar tudo como está e empurrar para depois de 2024 as mudanças necessárias. Será tarde. Será muito tarde e estaremos ainda mais enterrados em dívida, pobreza e acomodamento. E então, partidos políticos, corporações e cidadãos incomodados, partem para a técnica dos rumores, das mentiras lançadas à boca pequena e para o boato fácil dito nos corredores das instituições, que se pretende e urge reformar, ou no café onde os reacionários tratam de propagandear a mentira em que acreditaram por assim o quererem e estarem predispostos. Podiam até fazer isso relativamente a ideias, conceitos, políticas, mas não, resolveram fazer relativamente a nomes, escolhas de pessoas e supostas vinganças pessoais. Tal tristeza, gente que seria capaz de agir apenas assim e acha que todos são iguais. No fundo são uns miseráveis incapazes de pensar com nobreza e serenidade a gestão da coisa pública porque se habituaram a ver, em cada esquina, um fantasma do jeito ao amigo, do nepotismo, da cunha e da perseguição e acham que somos todos iguais. Lamento desiludir, mas não somos todos iguais. Enquanto uns se perdem nos rumores e nos boatos e discutem pessoas e lugares outros estão mais preocupados em discutir políticas e soluções e em remendar o que se vai fazendo de malfeito. Podem inventar os rumores que quiserem, o que não conseguem fazer é desmontar, tecnicamente, as reformas que propomos e as soluções que apontamos.

Haja saúde

In Jornal Diário Insular edição de 2022.10.25 


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