19 de outubro de 2016

Mini Entrevista Diário dos Açores


Diário dos Açores - Como analisa esta vitória do PS?

Embora abaixo das sondagens conhecidas e das projeções à boca das urnas, a vitória do Partido Socialista nestas eleições Regionais vem no seguimento do que era esperado nos meios políticos da Região. No entanto, há a salientar o facto do Partido Socialista não se ter superado relativamente a 2012. Apesar da conjuntura favorável que vem de Lisboa, O PS perdeu 9500 votos, cerca de 18% do seu eleitorado, e um mandato relativamente às eleições de  2012. Parabéns a Vasco Cordeiro que soube, ao longo dos últimos 4 difíceis anos, aguentar uma boa parte do seu eleitorado  e aproveitar a onda de crescimento do PS nacional.

Diário dos Açores - O que vai acontecer ao PSD depois desta derrota?

O PSD, perdeu nestas eleições 6 760 eleitores, um mandato e tal como o PS 18% do seu eleitorado. Apesar de ter feito uma tentativa de renovação interna
 que eu classificaria de “depuração” necessária, não foi suficientemente convincente e não foi clarificador relativamente às questões ideológicas. O PSD Açores continua sem saber onde se vai posicionar dentro do espectro ideológico da politica doméstica, se mais liberal onde pode ocupar um espaço vazio e que deixou órfãos muitos eleitores especialmente em São Miguel, se mais social-democrata onde encontra no Partido Socialista um claro vencedor e um adversário difícil de combater.
O PSD, para seu bem, não pode continuar a “queimar” lideres à razão de um em cada dois anos sob pena de se esvair em prolongadas noites de facas longas.
Por ultimo é de salientar o facto de ter ganho novo folego recuperando a liderança da Ilha do Faial onde foi um claro e inequívoco vencedor ainda mais sendo a lita do PS encabeçada pela até agora Presidente da Assembleia Legislativa Regional dos Açores..

Diário dos Açores - Nos restantes partidos, o que mais o surpreendeu?

Foi dos chamados partidos mais pequenos que veio a grande resposta, a resposta mais assertiva e  onde o Povo Açoriano manifestou a sua racionalidade e cultura democráticas. Os pequenos subiram todos sem exceção, fazendo assim pensar que há espaço para todos e que a qualquer momento podem vir surpresas eleitorais de projetos como o PAN ou o  PURP que subiram bastante as suas votações e poderão chegar, já em 2020 a uma representação parlamentar.

A CDU apesar de ter crescido e ter garantido a vitória no círculo da Ilha das Flores, não conseguiu garantir a eleição do seu coordenador e pode entrar num período de debate interno que leve à substituição de Aníbal Pires na sua liderança. O Bloco de Esquerda é um dos justos vencedores entre os vencidos uma vez que conseguiu, pela primeira vez eleger diretamente a sua coordenadora pelo circulo de São Miguel consolidando a sua posição de 3ª força política na Ilha, assim como também é vencedor o CDS que passou a segunda força politica na Ilha de São Jorge relegando o Partido Social Democrata para a 3ª posição e viu aumentado o número de Deputados eleitos apesar de ter falhado a eleição de um deputado pelo circulo eleitoral de São Miguel objetivo no qual se empenhou como nunca havia sido visto até agora.

Diário dos Açores - E a abstenção?

A abstenção, retirada a chamada abstenção técnica que deverá rodar os 20 pontos percentuais,  entre o recenseamento automático as ausências no estrangeiro e a desatualização dos cadernos eleitorais por óbito não declarado de cidadão sem o respetivo cartão, deverá ficar-se nos 40% o que se aproxima bastante dos valores que se registam nas maiores e mais consolidadas democracias mundiais como o Reino Unido ou os Estados Unidos da América.
Há , no entanto, que considerar a enorme responsabilidade dos dois maiores partidos nessa percentagem de gente que não deseja expressar o seu voto, e essa responsabilidade fica clara quando analisamos os números e constatamos que, em relação ao ato eleitoral anterior,   o número de abstencionistas aumentou precisamente na mesma dimensão dos votos que os dois maiores partidos perderam. São os eleitores descontentes com as promessas por cumprir, com a indefinição ideológica dos dois maiores partidos e desencantados por entenderem e expressarem a ideia de que o seu voto em nada muda porque seja quem for que para lá vá fica tudo na mesma. Felizmente não é assim e já existiram provas de que assim não é.

Por outro lado, os partidos mais pequenos, têm sido os grandes responsáveis pelo envolvimento de pessoas novas e de novas ideias no sistema e isso reflete-se nas suas proporcionais subidas. Por último e ainda em relação à abstenção, muitas vezes apontada como o grande mal da democracia, convém sempre lembrar os mais desatentos que abster-se, em qualquer circunstância, tem que ser encarado como um direito e nunca como uma displicência, todos temos o direito de não nos revermos em qualquer projeto e de querermos assim expressar o nosso desencanto. No entanto, o exercício do voto secreto e universal é a única “arma secreta” que possuímos para nos defendermos dos supostos abusos de quem nos possa governar com recurso a esses mesmos abusos. Por isso, votar é um garante das nossas liberdades individuais, bem esse que apenas valorizamos quando o perdemos. A bem da democracia e do debate mais plural e construtivo é salutar que a abstenção baixe e que a representatividade aumente. Para isso todos temos que fazer um esforço em vez de apontarmos sempre o dedo aos partidos como os causadores de todos os males. Mudar depende de cada um de nós, mesmo dentro dos partidos, se nos abstivermos de lutar pelo que acreditamos resta-nos aceitar o que outros decidam por nós.

Publicado no Diário dos Açores de 2016.10.18

13 de outubro de 2016

Parabéns melhor de sempre...


Robert Allen Zimmerman ou melhor dizendo, Bob Dylan foi o vencedor  anunciado do Nobel da Literatura 2016. 
Era já tempo da academia Sueca reconhecer nos poetas cantores uma outra forma de literatura, ou como dizia António Manuel Ribeiro, vocalista dos UHF  nos  anos 80 do século XX, “os poetas do século XX não escrevem livros, armam-se em cantores e soltam gritos de rebelião”.

Certamente não foi pelo “pastelão”  de seu titulo Tarântula, trazido aos escaparates em 1971 mas escrito em 1966 (tem a minha idade) ou pela sua Autobiografia de 2005 que Dylan alcança o desiderato que hoje foi publico. Mas foi, com certeza, por obras como Slow Train Coming de 1979 ou Knocked Out Loaded de 1986 ou ainda por coisas mais recentes como  Together Through Life de 2009.

10 de outubro de 2016

Rufina, Dona Rufina de Melo Tavares

Rufina é uma bela e contagiante história de tantas e tantas mulheres destas ilhas repletas de partidas e regressos, muitíssimo bem contada e adjetivada pelo Miguel Soares de Albergaria. Como o próprio diz, entre a realidade e a ficção, Rufina, chegada à ilha aos 25 anos de idade vai contando a história e caracterizando a sociedade micaelense que encontrou num espaço temporal  de meio século na transição de XIX para XX. Francisco Luís Tavares, politico, advogado, Juiz, pensador é o personagem principal deste romance que começa com uma sua carta dirigida à mãe pedindo-lhe ajuizados conselhos na questão da greve académica de 1907 e termina com a avisada resposta dessa mulher “que soube construir uma vida como a sua”.
Rufina, Srª D. Rufina de Mel(l)o Tavares, sobrevivente de uma de tantas casas de desvalidos, uma dessas grandes “latrina onde a sociedade escondia as sobras” é um hino à perseverança, uma apologia do trabalho, uma ode à libertação da mulher não pelo reclamar constante de direitos mas pelo exercício efetivo da cidadania, um tratado da libertação e da conquista pela força da razão e  com a graça de Deus.
Tantas Rufinas há e quantas ainda estão para nascer mesmo neste século XXI da cibernética e do multiculturalismo?
O presépio da tias Jacinta e Abigail, ou melhor, a montagem deste e a discrição das suas figuras, mandadas fazer e pintar a preceito e a jeito, a disposição dessas mesmas figuras estrategicamente entre patamares devidamente separados e estratificados, constitui um retrato, uma crónica costumeira de Ponta Delgada e São Miguel no final do século da laranja e transporta o leitor para a época deixando-nos embrenhar no cheiro dos laranjais, no bafo húmido e asfixiante de uma estufa de ananases acabada de receber fumo. Um livro, tem que ter esta capacidade de nos transportar, de nos fazer revisitar, este atributo único de ser uma espécie de máquina do tempo em regressos ao passado e ao futuro.
Sem recurso ao grotesco ou à violência ou sequer ao sexo gratuito, coisa que até poderia ter acontecido se atentarmos à realidade desse tempo em Terras e Vera Cruz , o Miguel Albergaria cativa-nos enquanto leitores transportando-os para a época contando-nos, “romanceadamente” e de um ponto de vista sociológico, um pouco, bastante, da história das estórias que ouvimos contadas dos nossos avós nesta cidade de Ponta Delgada e da sociedade micaelense de então. Longe de ser um grande romance histórico é um bom romance com histórias das nossas estórias. O “dinheiro velho” em contraponto ao “dinheiro novo” da Laranja e de como uma certa burguesia se aristocratizou. A forma rude e severa como a sociedade, infelizmente ainda hoje, idolatra ou despreza um ser humano pelo volume da sua carteira ou pelo cargo que ocupa num serviço publico. O nascimento e a ascensão do Doutor Francisco Luís Tavares (bisavô do autor), figura incontornável da primeira metade do século XX micaelense quer na consolidação da República da qual foi Deputado Constituinte quer na oposição ao regime musculado do Doutor Oliveira Salazar.
Há, por fim, ao longo de todo o romance uma presença permanente da família como núcleo centrifugo e uma apologia da mesma como garante não só da estabilidade emocional dos que dela necessitam como também da força e do apoio que o ser humano requer para vencer as desventuras e as adversidades da vida terrena. Deus e a Família foram o suporte desta Rufina que o Miguel Albergaria, a bom tempo, resolveu trazer aos escaparates pela mão da Companhia das Ilhas. Anthero, o Santo Anthero, revolucionário e racionalista também lá está.

Bem hajas meu amigo.

8 de outubro de 2016

Quem muito se abaixa o...

Quem muito se abaixa o …

Chegou num Avião de fabrico estadunidense (eles não confiam na sua própria tecnologia), chama-se Li Keqiang, é o primeiro-ministro da República Popular da China e esteve segunda  e terça-feiras  passadas, 26 e 27 de Setembro,  nos Açores, mais propriamente na Ilha Terceira (onde havia de ser?), depois de ter realizado um conjunto de viagens que incluíram a “amiga” Cuba, a sede da ONU na “Big Apple” e o Canadá. 
De acordo com a informação oficial saída de Pequim pela Boca do seu mais alto representante para os negócios estrangeiros, tratou-se de uma escala técnica. No entanto, como há oportunidades que não se podem perder, O Ministro da propaganda do PS disfarçado de Ministro dos Negócios Estrangeiros de Portugal  acompanhado do Candidato do PS a deputado pelo maior circulo dos Açores disfarçado de Presidente do Governo dos Açores, lá foram, a correr, investidos de profícuos dotes de  vendedores de “bacalhau-a-pataco” rapidamente e em força para a Praça Velha (para o que havia de estar reservado tão nobre lugar) no encalce de que essa visita pudesse dar à pré campanha do PS na Ilha Terceira qualquer coisa que não seja mais uma mão cheia de coisa nenhuma.
Até aqui tudo bem, “com papas e bolos se enganam os tolos” e quem se deixa enganar por um prato de chinesices não tem senão aquilo que merece.
Essa campanha começou há muito, esta visita só veio demonstrar, para os mais atentos à geopolítica, que tudo o que tem sido feito e dito sobre as lajes não passa, de facto, de  “papas para tolos” travestidas de PREIT.
Em Abril passado, outro propagandista da república (hoje em dia os ministros falam pela voz dos assessores de imprensa), veio em jeito de dar o jeito à propaganda de cá, dizer que o Governo Português pondera dar uso civil mais consistente à Base das Lajes”. Ora agora ficou bem provado que quem manda na Base aérea nº 4 é o Pentágono e mais nada nem ninguém. O episódio que marcou o retardamento da partida do Boing 747 chinês para aterragem de seis aviões de ataque americanos é bem revelador do que pode e vai sempre acontecer nas Lajes enquanto os americanos quiserem. Pode ser o primeiro-ministro da china como pode ser o voo X da companhia de baixo custo Y.
Fizeram bem, Marcelo Rebelo de Sousa e António Costa em não virem aos Açores participar do “festim no pagode”, esta não foi e nem podia ser uma visita de estado e há que manter a dignidade dos cargos sob pena de, pela banalização, se perder a dignidade das instituições. As relações internacionais são um campo fértil, por ignorância nuns casos, por má-fé noutros, para abusos de interpretação e transposição para a ordem politica interna de assuntos que são da ordem da política externa. Esta não foi uma visita de estado, foi uma escala técnica.
Esse episódio traz-nos (aos mais desatentos, para mim não é novidade), no entanto, muito boas notícias, os Açores continuam (como eu sempre disse) em termos de geopolítica e geoestratégia, no centro do “realismo intrínseco” do Pentágono, caso contrário os Americanos já tinham feito do chamado acordo bilateral um monte de papel rasgado. Sai é muito mais barato e tem mais efeito dissuasor uma operação do tipo da que aconteceu terça-feira passada do que manter um efetivo permanente na Ilha Terceira. Cabe a Portugal fazer pressão, ameaçar mesmo rasgar o tal acordo se necessário, para garantir mais efetivos e mais investimento americano na Base Aérea nº 4. Cabe a Portugal zelar pelos seus interesses e não ceder aos interesses externos com anuência subserviente.
Nem tudo são más notícias portanto.

Ponta Delgada 1 de Outubro de 2016


Nuno Barata
in Diário dos Açores edição de 08 de Outubro de 2016

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