12 de novembro de 2015

Mini entrevista Diário dos Açores

Diário dos Açores  - Com a queda do governo no parlamento, o que é que o Presidente da República fará agora?

Nuno Barata - Cavaco Silva está refém do seu próprio discurso e pouco mais poderá fazer do que devolver ao Parlamento a última palavra. Foi isso mesmo que o Presidente da República disse ao País quando indigitou Passos Coelho. Embora pouco provável, Cavaco Silva  pode, no entanto, decidir de duas maneiras a saber:

1-     Convoca Costa a Belém para o ouvir, acredita que existe um acordo de esquerda para um governo de 4 anos (que não há porque o próprio Costa já disse que os orçamentos vão ser negociamos caso a caso) e indigita-o primeiro-ministro. O folhetim acaba por aqui;

2-     Convoca Costa, ouve-o e solicita mais consistência nas propostas e mais responsabilização governativa dos seus parceiros na coligação (caso contrário nada há que dê garantias ao Presidente da República de que o Governo vai durar até à discussão do próximo Orçamento de Estado). Costa volta à roda das negociações com Catarina Martins e Jerónimo de Sousa à procura de uma solução governativa que foi o que Cavaco exigiu desde o início. Entretanto o Governo de Passos e Portas mantem-se em gestão com o orçamento de 2015. Esse cenário, pouco plausível, pode prolongar-se até às presidenciais fazendo Cavaco o papel de Pôncio Pilatos deixando a decisão para quem vier depois dele. Não seria a primeira vez que Portugal teria um governo de gestão. Neste caso nem é assim tão grave se tivermos em conta que o orçamento por duodécimos teria como base o orçamento de 2015 que foi um bom Orçamento de Estado.

Diário dos Açores  - Do que se conhece do acordo à esquerda, acredita que o governo de António Costa será "consistente e duradouro"?

Nuno Barata - Para as nações, como para os indivíduos, as vida rege-se por uma conta de deve e haver. Até agora e do acordo que se conhece e de tudo o que foi propalado por António Costa e parceiros, apenas se conhece a parte da despesa e a assunção clara de que o défice se manterá dentro dos limites impostos pelo Tratado Orçamental. Nada ainda foi dito sobre a parte da receita, absolutamente necessária, para fazer face a essa despesa e muito menos foi dito em questões de impostos. Cauteloso, Costa ainda não "assuntou" do ponto de vista fiscal o que pretende fazer e o Bloco e o PCP falam de taxar os ricos e reverter as privatizações, ora isso são as cascas dos ovos e segundo se sabe não se fazem omeletas com cascas. Este assunto tabu será discutido, certamente, em sede de Orçamento de Estado para 2016 onde a discórdia entre as esquerdas ficará patente. Importa lembrar que nas tais contas do deve e do haver a matemática é implacável. Mais despesa requer mais receita (impostos diretos e indiretos) ou maior défice, não há soluções mágicas.

Diário dos Açores  - O papel de Carlos César como principal colaborador de António Costa terá sido determinante para esta reviravolta? Ele tem perfil para segurar os equilíbrios parlamentares à esquerda durante toda a legislatura?

Nuno Barata - O PS, constituindo Governo, enfrenta desafios que nenhum outro partido enfrentou em Democracia em Portugal. Na verdade, será a primeira vez que um partido governa com minoria parlamentar de apoio não sendo força mais votada e com as forças da oposição sem fragilidades. Convenhamos, PSD e CDS-PP estão mais fortes hoje do que estavam em 4 de Outubro.
A situação atual não é comparável nem aos governos minoritários dos primórdios da nossa Democracia nem aos governos minoritários do Prof. Cavaco, do Eng. António Guterres ou do Eng. José Sócrates. O Professor Cavaco, no seu primeiro Governo, beneficiou de um desnorte no seio do PS, o Eng, Guterres beneficiou do apoio do CDS e Manuel Monteiro e de um certo descontrolo do PSD órfão do seu grande líder que havia sido Cavaco Silva e o Eng. Sócrates beneficiou de uma situação de conjugação da saída de Durão Barroso para a Europa e da militância socialista do presidente da República Jorge Sampaio que demitiu um Governo sustentado por uma maioria parlamentar estável sem explicar as suas razões ao País.
Nesse particular, o papel de Carlos Cesar ou de outro qualquer político do PS que tenha que fazer a ligação às outras forças políticas da esquerda está bastante dificultado.


Sem comentários:

Arquivo do blogue